Se, há alguns séculos, a máquina a vapor deslocou músculos humanos, hoje a inteligência artificial (IA) começa a deslocar – ou amplificar – nossas próprias faculdades mentais. No universo de Recursos Humanos, isso se manifesta como people analytics: o uso sistemático de dados para entender desempenho, engajamento e potencial de profissionais. Estudos recentes em R&S indicam que empresas que adotam analytics em escala podem reduzir em até 25% o tempo de contratação e aumentar em 15% a taxa de retenção no primeiro ano. Mas, como em toda tecnologia poderosa, a pergunta crucial não é apenas “o que podemos fazer?”, e sim “o que devemos fazer?”. Quando algoritmos começam a sugerir quem será contratado, promovido ou desligado, estamos delegando a sistemas estatísticos uma parte das decisões mais humanas das organizações.

O primeiro desafio ético é a ilusão de neutralidade. Um modelo de IA treinado com dados históricos de recrutamento tende a reproduzir, com exatidão quase cruel, os vieses do passado: se a empresa privilegiou determinados perfis, o algoritmo aprenderá a considerá-los “melhores”. Pesquisas internacionais mostram que, sem monitoramento, algoritmos de triagem automática podem reduzir em até 30% a visibilidade de candidatas mulheres ou de pessoas de grupos sub-representados em áreas técnicas. A promessa de eficiência pode, assim, cristalizar desigualdades. Por isso, a adoção de people analytics exige auditorias periódicas, transparência nos critérios usados e o direito explícito de contestação humana. A IA deve ser ferramenta de apoio, não oráculo infalível.

Há ainda uma segunda fronteira, mais sutil: a transformação da pessoa em dado. À medida que sensores digitais, plataformas internas e sistemas de colaboração registram cada clique, reunião e interação, surge a tentação de medir tudo – e, portanto, controlar tudo. Porém, um ambiente de trabalho inovador depende de autonomia, confiança e propósito, não de vigilância constante. Organizações responsáveis estão adotando três princípios: coleta mínima de dados necessária, anonimização sempre que possível e uso prioritário para desenvolvimento, não punição. A verdadeira questão, para líderes de RH e tecnologia no Brasil, não é se a IA substituirá pessoas, mas se teremos a coragem intelectual e moral de desenhar sistemas que ampliem nossa humanidade em vez de reduzi-la a um painel de indicadores. Em última análise, a ética da IA no trabalho não é um problema técnico, e sim um teste de maturidade da própria espécie que a criou.

Artigo Original: How People Analytics Help Solve HR and Talent Management Challenges

Por Redação

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