Quando uma nova tecnologia entra no ambiente de trabalho, costumamos olhar primeiro para os ganhos de eficiência, os cortes de custo, os gráficos ascendentes em relatórios de produtividade. Contudo, como mostra a discussão recente sobre o impacto da inteligência artificial (IA) nas relações de trabalho, há uma dimensão menos visível e muito mais delicada: a teia de relações humanas que sustenta toda organização. Não é apenas o posto de trabalho que muda; é a forma como confiamos uns nos outros, como colaboramos, como nos sentimos pertencentes a um time. E, se ignorarmos esse aspecto, corremos o risco de criar empresas tecnicamente avançadas, mas humanamente empobrecidas.
Ao incorporar IA em processos de recrutamento, avaliação de desempenho e gestão de pessoas, muitos líderes sonham com decisões mais rápidas, menos enviesadas, quase “matemáticas”. No entanto, algoritmos são construídos sobre dados humanos, carregados de vieses históricos, culturais e sociais. Em vez de eliminar preconceitos, a tecnologia pode amplificá-los silenciosamente. O dilema ético é claro: quando delegamos à máquina a triagem de currículos ou a recomendação de promoções, quem é o verdadeiro responsável por excluir um candidato, favorecer um perfil ou enfraquecer a diversidade? Não é a IA que deve responder perante a lei, à sociedade ou à consciência; somos nós, seus criadores e usuários.
Do ponto de vista da atração de talentos, a situação é ainda mais paradoxal. Em um mercado em que profissionais buscam propósito, confiança e um ambiente saudável, a adoção apressada de IA pode minar exatamente esses pilares. Se colaboradores percebem que decisões sobre suas carreiras são tomadas por sistemas opacos, a sensação de justiça e transparência se dissolve. Surgem a desconfiança, o medo de substituição e o isolamento entre colegas. Essa erosão das relações de trabalho tem impacto direto na marca empregadora, na capacidade de reter competências raras e de atrair novos talentos que queiram construir uma trajetória em um ecossistema que valorize a inteligência humana tanto quanto a artificial.
O desafio ético central, portanto, não é decidir se devemos ou não usar IA no trabalho; isso já está acontecendo e continuará. A verdadeira questão é sob quais princípios vamos orientar seu desenvolvimento e aplicação. Precisamos de diretrizes claras de governança, auditoria de algoritmos, participação ativa de profissionais de RH, líderes e colaboradores na concepção dessas ferramentas. Mais do que isso, é necessário um compromisso explícito: nenhum avanço tecnológico pode servir de pretexto para abdicar da responsabilidade humana. A IA pode processar dados em escala colossal, mas continua moralmente cega. Cabe a nós, humanos, decidir que tipo de futuro queremos para o mercado de trabalho, para a gestão de pessoas e para a atração de talentos — um futuro em que a tecnologia amplifica nossa humanidade, em vez de substituí-la por uma eficiência fria e desprovida de sentido.
Artigo Original: Workplace relationships hit hard by AI adoption

